domingo, 2 de maio de 2010

Refletindo sobre as águas das imagens - Pelos Jardins Boboli

A leitura da imagem

Primeira parte

Infelizmente priorizamos para as crianças, de forma até perversa,

o aprendizado da leitura das palavras como atestado de alfabetização.

Seria mais conveniente se, nas escolas de ensino fundamental,

a iniciação à leitura das imagens precedesse a alfabetização

convencional. Certamente teríamos no futuro melhores leitores e

apreciadores das artes plásticas, do cinema e da TV, além de cidadãos

mais críticos e participativos diante de todo o universo icônico que

nos cerca. A própria posterior alfabetização convencional seria muito

mais agradável às crianças.

Em termos de ilustração, como podemos criar belas imagens para o pequeno

leitor, se ele no máximo aprende a decodificar palavras? A alfabetização

visual proporcionaria à criança não apenas uma leitura melhor,

mas também valorizaria a importância e a beleza das letras, dos

espaços em branco, das cores, da diagramação das páginas e da relação

entre texto e imagem. Realçar o que existe de magia e de descoberta

em cada livro é a melhor forma de incorporá-lo ao cotidiano

das crianças.

Os critérios de avaliação e de escolha de livros ilustrados são geralmente

baseados no âmbito da “preferência pessoal”, alicerçados em gostos

e aversões não justificados. Assim como existe uma sintaxe das palavras,

existe também uma relativa sintaxe das imagens. Logicamente

que para “ler” uma imagem é impossível adotar um método rígido,

um sistema, por exemplo, que avalie unicamente as questões estruturais

— ritmo, linha, cor, textura etc.

É bom esclarecer, logo no início de nossa caminhada e de nossa visitação

às imagens, que estes textos não têm nenhuma pretensão de

ser didáticos. São reflexões, até porque, como foi dito, não há uma

gramática das imagens, muito menos um manual, um receituário de

qualidade. Muitos outros fatores, além dos estruturais já citados, concorrem

para sua correta fruição.


O Vento - Livro de imagem - Rui de Oliveira - Editora DCL - 2008


Nesse sentido atua a estética, uma reflexão filosófica que de modo algum

está preocupada com definições rígidas da obra de arte. Na verdade,

todas as linhas de estudo do fenômeno artístico — sejam por

meio da sociologia da arte, da psicologia, da história da arte e até

mesmo da biografia do artista — são conhecimentos sempre parciais.

A leitura de uma obra de arte se dá por camadas, níveis, filtros

esclarecedores; são aproximações que nos revelam uma das muitas

faces da arte.



Este texto é um fragmento do livro Pelos Jardins Boboli - Reflexões sobre a arte de ilustrar livros para crianças e jovens -

Rui de Oliveira - Editora Nova Fronteira - 2008.



3 comentários:

  1. Fernando F. Rodrigues12 de maio de 2010 às 09:39

    Muito interessante sua proposta de alfabetização visual, professor! Acho uma idéia mui válida de ser posta em prática.

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  2. No meu caso, eu entrei totalmente analfabeta na EBA, tudo o que sabia de arte era o pouco que aprendi frequentando a mísera bilioteca de minha escola pública no interior de MG,e apenas conhecia a parte literária. No interior do país se você frequenta bibliotecas você é um esquisito, anti-social e metido a inteligente...na escola primária era obrigada a 'colorir' no método das professoras, me aborreci. Minha primeira aula de desenho na vida foi exatamente a minha primeira aula de Desenho Artístico na UFRJ, aos 19 anos, uma calamidade que me traumatizou mais ainda. Posso dizer que 'meu desenho' melhorou substancialmente depois de assistir aulas de Análise da Imagem, com o mestre Rui, a forma como ele apresenta e ao mesmo tempo desvenda os grandes da pintura e da ilustração está presente, também, nesse livro e é esse o outro lado do "espelho", é só seguir a "trilha de tijolos amarelos". Ao final penso que ainda estou me alfabetizando, e a leitura do livro prosegue calma e enriquecedora.

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