A leitura da imagem
Primeira parte
Infelizmente priorizamos para as crianças, de forma até perversa,
o aprendizado da leitura das palavras como atestado de alfabetização.
Seria mais conveniente se, nas escolas de ensino fundamental,
a iniciação à leitura das imagens precedesse a alfabetização
convencional. Certamente teríamos no futuro melhores leitores e
apreciadores das artes plásticas, do cinema e da TV, além de cidadãos
mais críticos e participativos diante de todo o universo icônico que
nos cerca. A própria posterior alfabetização convencional seria muito
mais agradável às crianças.
Em termos de ilustração, como podemos criar belas imagens para o pequeno
leitor, se ele no máximo aprende a decodificar palavras? A alfabetização
visual proporcionaria à criança não apenas uma leitura melhor,
mas também valorizaria a importância e a beleza das letras, dos
espaços em branco, das cores, da diagramação das páginas e da relação
entre texto e imagem. Realçar o que existe de magia e de descoberta
em cada livro é a melhor forma de incorporá-lo ao cotidiano
das crianças.
Os critérios de avaliação e de escolha de livros ilustrados são geralmente
baseados no âmbito da “preferência pessoal”, alicerçados em gostos
e aversões não justificados. Assim como existe uma sintaxe das palavras,
existe também uma relativa sintaxe das imagens. Logicamente
que para “ler” uma imagem é impossível adotar um método rígido,
um sistema, por exemplo, que avalie unicamente as questões estruturais
— ritmo, linha, cor, textura etc.
É bom esclarecer, logo no início de nossa caminhada e de nossa visitação
às imagens, que estes textos não têm nenhuma pretensão de
ser didáticos. São reflexões, até porque, como foi dito, não há uma
gramática das imagens, muito menos um manual, um receituário de
qualidade. Muitos outros fatores, além dos estruturais já citados, concorrem
para sua correta fruição.
Nesse sentido atua a estética, uma reflexão filosófica que de modo algum
está preocupada com definições rígidas da obra de arte. Na verdade,
todas as linhas de estudo do fenômeno artístico — sejam por
meio da sociologia da arte, da psicologia, da história da arte e até
mesmo da biografia do artista — são conhecimentos sempre parciais.
A leitura de uma obra de arte se dá por camadas, níveis, filtros
esclarecedores; são aproximações que nos revelam uma das muitas
faces da arte.
Este texto é um fragmento do livro Pelos Jardins Boboli - Reflexões sobre a arte de ilustrar livros para crianças e jovens -
Rui de Oliveira - Editora Nova Fronteira - 2008.
Muito interessante sua proposta de alfabetização visual, professor! Acho uma idéia mui válida de ser posta em prática.
ResponderExcluirEu li este livro... é ótimo!!!
ResponderExcluirNo meu caso, eu entrei totalmente analfabeta na EBA, tudo o que sabia de arte era o pouco que aprendi frequentando a mísera bilioteca de minha escola pública no interior de MG,e apenas conhecia a parte literária. No interior do país se você frequenta bibliotecas você é um esquisito, anti-social e metido a inteligente...na escola primária era obrigada a 'colorir' no método das professoras, me aborreci. Minha primeira aula de desenho na vida foi exatamente a minha primeira aula de Desenho Artístico na UFRJ, aos 19 anos, uma calamidade que me traumatizou mais ainda. Posso dizer que 'meu desenho' melhorou substancialmente depois de assistir aulas de Análise da Imagem, com o mestre Rui, a forma como ele apresenta e ao mesmo tempo desvenda os grandes da pintura e da ilustração está presente, também, nesse livro e é esse o outro lado do "espelho", é só seguir a "trilha de tijolos amarelos". Ao final penso que ainda estou me alfabetizando, e a leitura do livro prosegue calma e enriquecedora.
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